Baby, hj
acordei e, como de costume, coloquei no random do Spotify. A primeira música
que tocou foi comme d’habitude. Lembrei de ti imediatamente. Me levantei, te
procurei, mas vc não acordará, como de costume. Isso ainda me dói. Vai me doer
pra sempre. Hj seria o dia de enviar minha melhor mensagem de aniversário
descontraída e tu dizer que não precisava. Eu retrucaria dizendo: ‘mas como não
precisa? Precisamos comemorar sempre! Pro universo saber que gostamos de viver…’
Meu bem,
meu retrovisor, meu avesso. Eu, capricorniana com ascendente em áries. Vc
ariana com ascendente em capricórnio. Nunca gostamos tanto das mesmas coisas
para além de nossos amigos-amores. Você gostava de viajar pra lugares de
grandes construções e ruinas. Eu sempre quis praia, areia e água de coco. Você
sempre gostou de tecnologia e eu sempre fui mais retardatária com isto. Vc
sempre early adopter e eu laggard. Vc sempre disse que eu era muito inteligente
e trabalhava muito, mas fui eu que sempre te chamei de oráculo. Tu sempre foi
meu google, até antes dessa droga toda existir. Tu foi minha enciclopédia Barsa
até dia desses. Vc sempre foi brilhante. Bri-lhan-te! Enquanto você se engajava
em política econômica para países emergentes, eu só queria que legalizassem o
aborto e a maconha. Tu me criticava pq eu usava sombra de 30 cores ao mesmo
tempo e no fim das contas, quem usava lantejoulas no almoço de domingo? Quem,
minha senhora?
Em uma
coisa convergíamos. Gostávamos de livros impressos e sempre andávamos rápido.
Muito rápido. Sempre tivemos muita pressa de viver. Sempre juntamos dinheiro
pra viajar. Quanto mais longe, melhor. Sempre gostamos de desbravar o mundo pra
que o diferente não nos causasse estranheza a ponto de gerar preconceitos. Vc
lia Nietzsche e eu Paulo Coelho. Mundos muito diferentes mas com uma interseção
gigante. Vc falava de religiões e espiritualismo quando eu mal sabia rezar um
pai nosso. Tu já era grande quando eu ainda nem vislumbrava o que era isso. Tu
discutia as ideias de Adam Smith enquanto eu pensava nas fantasias de carnaval.
Tu queria ler e dormir, eu queria sair pra dançar e atravessar madrugadas. No
fim, penso que criamos um universo compartilhado de grandes experiências
diferentes. Acho que foi a forma que encontramos de viver o dobro no pouco
tempo que nos foi permitido.
Lembro de
quando cheguei em Portugal e o câmbio disparou. Eu fiquei muito perturbada com
as contas. Passava horas do dia refazendo-as pra tentar chegar no fim do mês. No
pior dia, quando pensei em desistir e comecei a arrumar as malas pra voltar vc
me ligou. Sempre randomicamente, pq nunca fomos pessoas de passar a mão no
telefone e ligar sem avisar. Nunca gostamos de incomodar. Vc me ligou e disse: “Robertinha,
fiz minhas contas aqui! Sei quanto vc ganha e sei que tá phoda. Vou pagar seu
doutorado até vc se organizar! Não se preocupe! Você vai terminar isto! Lembra
que não sabermos perder!” Eu desliguei o telefone e comecei a chorar. Copiosamente.
Vc sabia que eu não sabia pedir e teve essa sensibilidade. Eu fiquei tão em
choque que nem consegui recusar. E nem podia.
Eu ganhei
bolsa! Na verdade, mais de uma. Tá tudo em ordem por aqui. Sigo lembrando de
você em cada madrugada de trabalho. Em cada artigo aprovado. Em cada pesquisa
apresentada. Esses dias vou pra Tailândia apresentar minhas coisas. Essa era
uma viagem que queríamos muito fazer mas tu era preguiçosa. Não queria passar
24 horas em trânsito. Ontem terminei o artigo do dispositivo pra Parkinson que
fiz pro painho. Ficou muito bom. Lembrei de vc. Foi você que patrocinou uma
parte da pesquisa. Quando faltaram equipamentos, tu me chegou com um pacote do
Ali perguntando se prestava. Prestou! Não deu tempo de vocês verem pronto, mas
prestou! Funciona mesmo! E eu lembro de vocês.
Hoje o
aniversário é seu, mas foi vc que me deu um presente. Acordei com uma excelente
notícia no whatsapp. Um convite irrecusável que envolve uma pesquisa que você
apoiaria. Lembrei de vc. Eu sempre lembro de vc! Deve ser a tua forma de
continuar me incentivando daí de cima. Às vezes, quando sento pra escrever,
volto pra ler uns textos teus. Sempre tem uma palavra difícil que passo a usar.
Hoje o aniversário é seu, e eu queria muito te dar um abraço, cantar 30
parabéns com 30 bolos diferentes pq sim! Os aniversários sempre gostamos de
comemorar muito bem comemorado! Sempre 25 anos! Sempre com muitos bolos e muita
purpurina. Hoje o seu aniversário virou quarta-feira de cinzas. Um sentimento
de ressaca, de saudades do que não deu tempo de viver. Vc sempre foi grande! A
maior! E eu, quando crescer, também quero ser grande, como vc!
Feliz
aniversário, te amo! Sua Robertinha!