organizando os ingredientes

Este blog é escrito por Roberta Dutra. Nasci em Belém do Pará e passei maior parte da vida no Ceará, me mudei algumas vezes, viajei pelo mundo outras tantas e atualmente moro em Santa Catarina. Cresci em família grande, com muitos primos, primas, tios, tias e mais uns tantos agregados das mais variadas espécies. Tive uma infância plena e feliz e hoje, embora seguindo feliz, sofro muito de saudade. Registro aqui algumas impressões peculiares sobre a vida e seus desdobramentos, sobre o cotidiano e alguns tantos textos escritos para algumas pessoas em particular que exerceram e ainda exercem grande influência na minha vida, além de fazerem parte das minhas melhores lembranças, é claro! Não tenho grandes pretenções literárias, gramaticais nem sequer ortográficas, mas escrevo com muito amor, que é o que todo mundo precisa. Resumindo, mantenho o blog como meio de comunicação entre amigos e famíla distante e possíveis interessados. Entre e fique a vontade...

be my guest!

terça-feira, 4 de abril de 2023

Por toda a minha vida

 


São demais os perigos desta vida
Pra quem tem paixão principalmente
Quando uma lua chega de repente
E se deixa no céu, como esquecida

E se ao luar que atua desvairado
Vem se unir uma música qualquer
Aí então é preciso ter cuidado
Porque deve andar perto uma mulher

Deve andar perto uma mulher que é feita
De música, luar e sentimento
E que a vida não quer de tão perfeita

Uma mulher que é como a própria lua:
Tão linda que só espalha sofrimento
Tão cheia de pudor que vive nua

Baby, hj acordei e, como de costume, coloquei no random do Spotify. A primeira música que tocou foi comme d’habitude. Lembrei de ti imediatamente. Me levantei, te procurei, mas vc não acordará, como de costume. Isso ainda me dói. Vai me doer pra sempre. Hj seria o dia de enviar minha melhor mensagem de aniversário descontraída e tu dizer que não precisava. Eu retrucaria dizendo: ‘mas como não precisa? Precisamos comemorar sempre! Pro universo saber que gostamos de viver…’

Meu bem, meu retrovisor, meu avesso. Eu, capricorniana com ascendente em áries. Vc ariana com ascendente em capricórnio. Nunca gostamos tanto das mesmas coisas para além de nossos amigos-amores. Você gostava de viajar pra lugares de grandes construções e ruinas. Eu sempre quis praia, areia e água de coco. Você sempre gostou de tecnologia e eu sempre fui mais retardatária com isto. Vc sempre early adopter e eu laggard. Vc sempre disse que eu era muito inteligente e trabalhava muito, mas fui eu que sempre te chamei de oráculo. Tu sempre foi meu google, até antes dessa droga toda existir. Tu foi minha enciclopédia Barsa até dia desses. Vc sempre foi brilhante. Bri-lhan-te! Enquanto você se engajava em política econômica para países emergentes, eu só queria que legalizassem o aborto e a maconha. Tu me criticava pq eu usava sombra de 30 cores ao mesmo tempo e no fim das contas, quem usava lantejoulas no almoço de domingo? Quem, minha senhora?

Em uma coisa convergíamos. Gostávamos de livros impressos e sempre andávamos rápido. Muito rápido. Sempre tivemos muita pressa de viver. Sempre juntamos dinheiro pra viajar. Quanto mais longe, melhor. Sempre gostamos de desbravar o mundo pra que o diferente não nos causasse estranheza a ponto de gerar preconceitos. Vc lia Nietzsche e eu Paulo Coelho. Mundos muito diferentes mas com uma interseção gigante. Vc falava de religiões e espiritualismo quando eu mal sabia rezar um pai nosso. Tu já era grande quando eu ainda nem vislumbrava o que era isso. Tu discutia as ideias de Adam Smith enquanto eu pensava nas fantasias de carnaval. Tu queria ler e dormir, eu queria sair pra dançar e atravessar madrugadas. No fim, penso que criamos um universo compartilhado de grandes experiências diferentes. Acho que foi a forma que encontramos de viver o dobro no pouco tempo que nos foi permitido.

Lembro de quando cheguei em Portugal e o câmbio disparou. Eu fiquei muito perturbada com as contas. Passava horas do dia refazendo-as pra tentar chegar no fim do mês. No pior dia, quando pensei em desistir e comecei a arrumar as malas pra voltar vc me ligou. Sempre randomicamente, pq nunca fomos pessoas de passar a mão no telefone e ligar sem avisar. Nunca gostamos de incomodar. Vc me ligou e disse: “Robertinha, fiz minhas contas aqui! Sei quanto vc ganha e sei que tá phoda. Vou pagar seu doutorado até vc se organizar! Não se preocupe! Você vai terminar isto! Lembra que não sabermos perder!” Eu desliguei o telefone e comecei a chorar. Copiosamente. Vc sabia que eu não sabia pedir e teve essa sensibilidade. Eu fiquei tão em choque que nem consegui recusar. E nem podia.

Eu ganhei bolsa! Na verdade, mais de uma. Tá tudo em ordem por aqui. Sigo lembrando de você em cada madrugada de trabalho. Em cada artigo aprovado. Em cada pesquisa apresentada. Esses dias vou pra Tailândia apresentar minhas coisas. Essa era uma viagem que queríamos muito fazer mas tu era preguiçosa. Não queria passar 24 horas em trânsito. Ontem terminei o artigo do dispositivo pra Parkinson que fiz pro painho. Ficou muito bom. Lembrei de vc. Foi você que patrocinou uma parte da pesquisa. Quando faltaram equipamentos, tu me chegou com um pacote do Ali perguntando se prestava. Prestou! Não deu tempo de vocês verem pronto, mas prestou! Funciona mesmo! E eu lembro de vocês.

Hoje o aniversário é seu, mas foi vc que me deu um presente. Acordei com uma excelente notícia no whatsapp. Um convite irrecusável que envolve uma pesquisa que você apoiaria. Lembrei de vc. Eu sempre lembro de vc! Deve ser a tua forma de continuar me incentivando daí de cima. Às vezes, quando sento pra escrever, volto pra ler uns textos teus. Sempre tem uma palavra difícil que passo a usar. Hoje o aniversário é seu, e eu queria muito te dar um abraço, cantar 30 parabéns com 30 bolos diferentes pq sim! Os aniversários sempre gostamos de comemorar muito bem comemorado! Sempre 25 anos! Sempre com muitos bolos e muita purpurina. Hoje o seu aniversário virou quarta-feira de cinzas. Um sentimento de ressaca, de saudades do que não deu tempo de viver. Vc sempre foi grande! A maior! E eu, quando crescer, também quero ser grande, como vc!

Feliz aniversário, te amo! Sua Robertinha!